"Não penseis que vim trazer paz à terra. Não vim trazer paz, mas a espada.
(...) Eu vim lançar fogo à terra, e que tenho eu a desejar se ele já está aceso?
(...) Julgais que vim trazer paz à terra? Não, digo-vos, mas separação."
(Jesus segundo Mateus e Lucas)
Meu filho, o ser humano tem a tendência natural ao comodismo, individual e coletivo. São reconhecidos como bons valores pela sociedade a continuidade, a "normalidade", a previsibilidade. Toda comunidade tradicional ou conservadora é, aos olhos exteriores, calma, estável, tranquila. Um "mar calmo". Mas será que é esse o caminho da felicidade? O que está embaixo do tapete?
Normalmente a calma exterior esconde um vulcão interior, em que os sentimentos e pensamentos menos aceitos são recalcados em prol da aceitação social. Cria-se, então, um mundo interno inquieto esquizofrênico com o comportamento plástico exterior, gerando fortes distorções de personalidade e contradições que podem descambar em verdadeiras aberrações.
Padres que orientam, mas abusam de crianças.
Pastores que condenam gays e depois se assumem como tais.
Psicólogos que tratam, mas estão mergulhados em profundo conflito psíquico.
E outros tantos.
A sociedade pode, investindo nessa imutabilidade que só dá poder a uma classe controladora, após algum tempo, beirar o cômico, tendo regras tão estapafúrdias e desconectadas da necessidade de seu tempo que os reformadores precisam chocar para retirá-la da inércia.
Por isso um líder como Jesus disse que não era quem vinha trazer a paz, "mas a espada"? Porque ele sabia, filho, que, dado o grau de congelamento mental e ético daquela comunidade, só uma ruptura poderia fazê-la se movimentar novamente. É preciso expor a ferida que ficou sufocada durante tanto tempo para poder, então, tratá-la.
O que vale socialmente também vale individualmente. Medite:
A calma te tranquiliza; a paz te liberta.
A calma vem do comportamento; a paz vem da alma.
A calma te faz aceito; a paz te faz feliz.
A calma te acomoda; a paz te ilumina.
A calma esconde tua sombra; a paz te reconcilia com ela.
Calma é controle; paz é mudança.
A calma te protege de fora, mas pode te fragilizar por dentro.
A calma é treinamento; a paz é trabalho.
A calma é simples; a paz é conquista.
Não busque calma. Busque paz.
Enquanto seu interior estiver fervilhando, não se contente com o externo "normal". A estrada da paz às vezes passa por curvas tortuosas. Se o fogo transformador precisa vir, que venha logo, "tenha pressa que ele se acenda", como Jesus. Tenha urgência. Isso não é calma, mas é paz.