Meu filho, jamais existiu na História uma sociedade primordialmente composta por ateus. Parece existir nos povos de todas as épocas, culturas e costumes, tão diferentes entre si, algo surpreendentemente comum: uma tendência coletiva à aceitação da existência de um ou mais deuses.
É claro que há uma diversidade natural nas formas de se expressar essa ideia inata, todas elas compatíveis com o próprio progresso do pensamento e da Ciência. Quanto maior o grau de ignorância do funcionamento das coisas, maior o materialismo e a humanidade desse Ser Supremo sobre a vida cotidiana: deuses-animais, deuses-sentimentos, deuses-vingadores, deuses-humanos, deuses-favorecedores, etc. O mais interessante é que, com o tempo, ao invés de a ideia de um Criador se desfazer, como ocorreu com milhares de outras, ela se fortalece, mas se transformando, se reinventando, se desmaterializando, se purificando.
Hoje convivemos com diferentes graus de crença (ou descrença) nesse Arquiteto do Universo. Você deve respeitá-las todas. A sua, qualquer que seja, não é nem melhor nem pior, nem mais nem menos óbvia, nem mais nem menos inteligente, nem mais nem menos digna, do que qualquer outra. Posta esta primeira instrução, passo a listar alguns pensamentos meus sobre o tema para você:
- Fé não faz de ninguém melhor do que o outro. Ação sim. Verdadeira. Genuína. Consciente.
- Não perca a oportunidade de contemplar a beleza da vida. Essa reflexão com sentimento lhe trará algumas algumas respostas que nem a vida inteira de pensamento poderá lhe dar.
- Se sua crença se cristalizar em algo fácil, volte. Você pegou um atalho que não leva a lugar nenhum. Se te levar a uma separação de seres humanos com base em exterioridades, pior ainda. Corra para longe dali rápido: você, além de perdido, está ameaçado.
- Provar ou não a existência de um Ente Criador é um exercício de elucubração, mas não leva a nenhum resultado prático satisfatório. Muitos filósofos dedicaram muito esforço a isso e sempre se escolhe aquele de maior agrado ao que se quer, sem qualquer conclusão. O entendimento de uma realidade supra-humana só pode ser alcançado com inteligência supra-humana. Não é através do intelecto que se avança depois de determinado ponto.
- Se não se pode saber o que Ele É, com certeza se pode saber o que não é por impossibilidade de coerência. Retire de sua concepção do Divino qualquer aspecto humano. Não o admita ciumento, vingativo, parcial, barganhador, carente de adoração, nada disso.
- Não é honesto pedir a Deus favores pessoais nem deixar sua crença condicionada a eles. Seria tomá-lo por demais infantil ceder a esse tipo de chantagem. Se algo não ocorreu como você esperava, não é culpa Dele e se algo ocorreu que te deixou feliz não é favor Dele. Tudo é aprendizado. Considere Deus um Educador, jamais um parceiro de trocas de favores.
- Se for pedir algo, peça força e sabedoria para retirar das situações da vida aprendizados profundos que te transformem a alma para melhor. Todo o resto é fonte de frustração e aborrecimento desnecessários. Se for agradecer, agradeça a oportunidade de crescer em consciência de si próprio e do mundo.
Por fim, meu filho, não se culpe se não tiver inclinação à crença externa a Deus. Nem seu pai, nem Ele, se importam com rótulos. O que vale é que você seja sincero com sua consciência e seja um homem de bem. O resto é humano.
Que Deus te abençoe.