À guisa de introdução


Este é um espaço de coleção de pensamentos para meu filho Antonio.

Categorizei as postagens por fase da vida em que imagino que serão úteis a ele, divididas em períodos de 7 anos. Assim, onde estiver marcado "1setenio" são para de 0 a 7 anos, "2setenio" para 7 a 14, e assim por diante.


sábado, 28 de novembro de 2015

Eu ME proíbo

Filho, há algum tempo eu escrevi uma mensagem para você intitulada "Eu te proíbo". Agora é a minha vez.


Eu ME proíbo:
  • De não te ouvir, mesmo que não concorde com você;
  • De gritar com você, mas prometo ser firme e duro, se necessário;
  • De usar qualquer tipo de violência com você;
  • De não respeitar sua individualidade, a menos que te coloque em risco;
  • De interferir em suas escolhas amorosas, a menos que elas te coloquem em risco;
  • De menosprezar seus problemas e suas conquistas só porque eu já passei por eles;
  • De deixar você fazer sempre o que quiser por preguiça de te educar;
  • De perder a paciência com você, por mais que você se esforce para isso;
  • De deixar com que o trabalho roube minha qualidade de presença junto a você;
  • De querer que você cresça rápido demais;
  • De te ver como um bebê, quando você precisar crescer;
  • De não te ver como meu bebê, quando precisar do meu colo, seja com que idade for;
  • De não te dar a mão quando você precisar;
  • De te oferecer a mão quando você não precisar; 
  • De não te segurar quando você cair;
  • De te segurar quando você precisar ir;
  • De ser apenas seu pai quando deveria ser seu mestre; de ser apenas seu amigo quando deveria ser seu pai; de estar ausente quando deveria ser seu amigo.

A paternidade, filho, é também uma dança: preciso e vou deixar com que você se movimente, embora esteja te acompanhando os passos a todo momento.

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

"Father and son" - "Pai e filho" (Cat Stevens)

Filho, ontem eu ouvi novamente essa música de 1970 de Cat Stevens, e lembrei de você. Quando cheguei em casa, coloquei você no meu colo e a cantei para você duas vezes, com lágrimas nos olhos. Ela fala sobre conflito de gerações, sobre equilíbrio, sobre rompimento. Preciso que entenda por que a selecionei. Primeiro, vamos à música:

Tradução retirada do site LETRAS.MUS.BR: http://letras.mus.br/cat-stevens/38427/traducao.html

Filho, você terá muitas vezes a sensação de que é hora de se libertar mais fortemente de seus pais, seja querendo sair de casa, seja querendo viver um tempo longe, seja agindo sem a "proteção" paterna, seja tomando uma decisão divergente da minha opinião. É esperado que você aja assim - se os jovens não decretassem, em algum momento, sua própria liberdade existencial, jamais teríamos saído das cavernas e o mundo não teria progredido.

Mas há um problema: se você fizer isso antes do tempo, se machucará praticamente sem proveito de aprendizado; se deixar passar o tempo certo, sofrerá e voltar será mais difícil. Existe uma hora ideal para que o "cordão umbilical" seja afrouxado ou cortado. E não - não existe fórmula. É preciso descobrir a sua.

Na música, pai e filho são estereotipados: o pai se posiciona sempre contra a mudança e a favor da continuidade e o filho sempre a favor do rompimento. Quem está certo? Provavelmente a verdade está no meio do caminho entre eles.

Destaco uma frase dita pelo filho: "Mas são eles que sabem, não eu". A experiência dos outros, por mais que te amem, é deles. É preciso que você tenha as suas, nem que seja a custa de sofrimento e fracasso. Mas isso não pode ser feito a todo custo: não pode comprometer sua saúde, sua segurança, sua vida ou sua sanidade mental. Se estiver nesse ponto, eu irei intervir, mesmo que você não goste. Senão, por mais que me doa o coração, em prol de seu desenvolvimento, deixarei você experimentar.

Não crio você para mim, meu filho; crio você para você, para que você seja um ser humano bom, realizado, seguro e independente. Sei que, em algum momento, "quando houver uma maneira, você terá que ir". Seu pai estará com a mente tranquila, com o coração inquieto, com os olhos marejados, com as mãos abertas, e olhando e torcendo por você.

OBS: Hoje, a música (com a letra) está disponível no endereço: https://youtu.be/GxWFP6v3vQs. Caso isso seja velho demais quando você ler esta mensagem, procure onde for por "Father and Son" + "Cat Stevens" - a Internet pode ficar velha, essa música dificilmente.

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Terrorismo

Meu filho, toda vez que há a imposição do medo, da violência física ou psicológica, como arma de luta política, diz-se que há terrorismo. Por que ainda convivemos com ações desse tipo? É possível atribuir-lhes alguma causa? O que podemos fazer para contribuir para sua extinção?


Já te disse: não existe ação injustificada. Não significa que ela seja justa, boa, verdadeira ou lógica. Apenas que tem algum sentido, por mais torto que seja, para quem faz. O cérebro humano rejeita situações com ausência de causa/efeito, mesmo que sejam ilusórias. Significa dizer que para todo ato de terrorismo existe uma linha causal. Primeiro conselho: na sua análise, siga essa linha, por mais repugnante que lhe pareça. É a melhor chance que você terá para começar a entender a cabeça de quem se dispõe a cometer essas atrocidades.

O mundo tem sofrido recentemente com vários desses atos terroristas, em especial envolvendo ataques suicidas. Em 2001, o conhecido 11 de setembro em que aviões foram jogados contra as torres gêmeas de Nova Iorque; agora, em 2015, uma série de ataques de homens-bomba em vários lugares na África, no Oriente Médio e na Europa. Mas o que eles têm em comum?

O que é solo fértil para o desenvolvimento do pensamento terrorista? Existem basicamente 4 pilares:
  • A opressão humilhante: em especial os povos do Oriente Médio e da África têm sido submetidos, na História, a situações degradantes de vida, ora por seus próprios dirigentes, ora por financiamento do Ocidente com vistas à exploração de seus recursos naturais e mão-de-obra barata. Essa situação continuada gera a massa ideal para a revolta.
  • A ignorância profunda: normalmente sustentada pelo interesse escuso, que impede a população de analisar as situações e propor soluções que passam por depor os políticos opressores.
  • O radicalismo ideológico: a má interpretação religiosa ou social leva à radicalização das posições, fazendo crer viável um caminho torto e uma lógica deturpada.
  • A liderança mal-intencionada: é a faísca do processo. Aproveitando-se de uma combinação dos itens acima, um ser mal-intencionado ou louco lidera a população para a prática do terrorismo.

É importante ter cuidado ao julgar. Não existe vítima sem algoz, mas o algoz de hoje pode ter sido a vítima de ontem. Matar sua família de fome por ganância de exploração de seu país também não é uma forma de terrorismo? Financiar governos corruptos e ditatoriais que massacram a própria população em troca de dinheiro não é uma forma de terrorismo? Todas as grandes potências de hoje fizeram isso não há muito tempo com alguns dos países de onde estão saindo os homens-bomba. Não haveria aí uma relação de causa e efeito - que não justifica, mas explica, em parte, o terrorismo?

O terrosismo, filho, só se torna opção quando a própria vida perde o seu valor. É uma situação extrema e degradante. Combater o terrorismo, então, é:
  • Impedir que ele ocorra, com o uso da força, se necessário. Isso combate a consequência. Isso normalmente é feito. O simplismo e o interesse também alimentam a indústria da guerra.
  • Remediar as causas, algumas profundas, para cortar-lhe a raiz e esterilizar-lhe o solo. Isso normalmente é esquecido. Dá mais trabalho, mas é o único caminho duradouro.

Não seja mais um a analisar essas delicadas situações de forma superficial. Faça diferente. A construção de um mundo melhor não é apenas trabalho de apagar incêndio (ele tem que ser apagado): passa pela ação educativa, humana, de longo prazo. O terrorismo até pode ser sufocado temporariamente pela ação da força, mas só desaparecerá quando houver espaço para a verdadeira fraternidade.

domingo, 15 de novembro de 2015

Métrica poética

Meu filho, a poesia é uma arte de rara beleza. Alguns grandes poetas optaram por escrever suas obras usando uma técnica chamada de métrica poética: uma forma especial de contagem silábica que transmite a sensação de harmonia a quem ouve. Mas o que isso tem a ver com a vida?

Abaixo deixo um lindo poema de Olavo Bilac, o maior representante do Parnasianismo no Brasil, intitulado "Ouvir estrelas", com métrica rígida e versos hendecassílabos (com 11 sílabas poéticas, que são diferentes das sílabas contadas normalmente).


Quem faz os versos se preocupa com quem ouve, não com quem lê - esse é o segredo! Assim, por exemplo, a última sílaba do verso é desconsiderada e tudo o que se lê junto é contado como uma sílaba só. Isso se pode chamar orientação ao resultado, já que a poesia é para ser recitada e ouvida e precisa ser agradável ao ouvido e não necessariamente aos olhos.

Por vezes, filho, faz-se na vida o oposto:
  • Não se conhece o cliente final do trabalho e nem se sabe o que é importante a ele. Então, no afã por executar, na pressa por fazer, esquece-se de observar, planejar, entender. O resultado? Um poema sem métrica quando a ideia era tê-la.
  • Por medir-se errado, o produto é desagradável. Saber o que medir e como medir é essencial para atingir um objetivo lúcido.
  • Não se une coisas similares e contíguas por simplicidade, duplicando trabalho desnecessariamente. Com isso, cria-se a interrupção do processo apenas para satisfazer o processo, com perda ao resultado final. "E - eu - vos - di - rei: 'A - mai - pa - ren - ten - dê'" é como se "lê" poeticamente o primeiro verso da última estrofe. "Piramidando" ideias existentes surgirão outras novas, mais eficientes, mais coerentes, mais envolventes.
  • Gasta-se esforço e tempo nas "últimas sílabas" das coisas, que nem tônicas são. Pior ainda: se as contarmos, estamos piorando o nosso resultado. O mesmo verso acima ilustra também este ponto. Não perca o seu tempo com discussões inúteis ou de aplicação duvidosa.

Aprenda com os poetas, meu filho. Se quiser que o poema do seu trabalho seja agradável e útil, é necessário encará-lo como uma poesia parnasiana, com conteúdo, rimas ricas e métrica correta.

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Mulheres

Filho, você nasceu homem. O que isso significa? Vejamos.


Homens e mulheres são diferentes em muitos aspectos além dos óbvios anatômicos. Seja por força biológica, seja pela estrutura social vigente, a psique apresenta peculiaridades consideráveis. Não veja nisso qualquer julgamento de valor, apenas uma riquíssima diversidade de modelos mentais que pode ter sido (e continuar sendo) vital para a sobrevivência da nossa espécie.

O grande problema é que, pela maior força física da constituição masculina em uma sociedade bárbara, sempre se atribuiu à mulher um papel subjugado na ordem social, a ponto de se discutir, na igreja do século VI, se ela era humana, ou seja, se tinha ou não tinha alma. A cultura machista tem negado à mulher direitos que precisaram ser conquistados por elas à custa de muita luta, sofrimento e perseverança: o direito à educação, ao voto, à igualdade nas relações de trabalho, etc.

Você dirá que é parte da História. Mais ou menos, infelizmente. Ainda hoje (espero que bem menos ou nada na época em que você estiver lendo esta mensagem) as mulheres ainda não conquistaram socialmente igualdade de oportunidades em relação aos homens e - pasme - ainda há homens que acham que isso é errado ou exagerado.

E não para por aí: elas ainda têm que reivindicar coisas muito mais básicas: liberdade e respeito. Liberdade para usarem a roupa que quiserem sem precisarem se proteger de assédios de homens que ainda as tomam por objeto; respeito em relação a seu corpo, a suas ideias, a seus direitos.

Ainda parece longo o caminho, não é, filho? Como homem, você pode ajudar! Além de sua obrigação básica de tratar com respeito, também você deve exigir esse respeito dos outros. Algumas dicas:
  • Use humor, inteligência e delicadeza na abordagem às mulheres, seja por que motivo for (amizade, namoro, etc). Mas "não" é não. Ponto;
  • O corpo da mulher é dela, não é seu nem de outra pessoa qualquer. Nem por um minuto. Ponto;
  • Se as mulheres quiserem caminhar nuas na rua, é problema delas. Isso não dá a nenhum homem o direito de desrespeitá-las;
  • Brincar com as diferenças naturais entre homens e mulheres pode ser saudável, engraçado e socializador entre amigos/amigas, mas cuidado: não faça e não admita piadas de mal gosto com as mulheres. Se fosse você, gostaria de ouvir? Veja a cara delas para saber se está agradando ou não. Não está? Pare e peça desculpas;
  • Ter cuidado e reconhecimento das lutas das mulheres e da situação social ainda hostil a elas não é tratá-las como bibelôs. Isso só reforça o preconceito. Sem exageros.

Mais importante que todas essas posturas exteriores é sua posição interior - aquela que ninguém vê. Esteja certo de que, quando de frente a uma mulher, você está falando com um ser humano tão capaz quanto você, tão importante quanto você, tão inteligente quanto você, tão complexo quanto você.

Por fim, lembre-se o que o presidente estadunidense Abraham Lincoln disse certa vez: “A mão que balança o berço é a mão que governa o mundo”.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Resignação

Filho, se resignar é se conformar com alguma situação. Mas existem muitas formas diferentes de fazer isso: umas úteis, outras inúteis. Vamos falar sobre elas?

Selecionei esta imagem de um café na Inglaterra que usa um ditado comum naquele país como propaganda e que tem tudo a ver com o que vamos conversar: "Me dê café para mudar as coisas que eu posso & vinho para aceitar as coisas que eu não posso. Nós servimos os dois".

  • Ouça as experiências dos outros, mas não se prenda a elas. O impossível só é impossível porque ninguém conseguiu fazer ... ainda.
  • Na dúvida se alguma coisa desagradável é impossível de mudar, tente. Mas tenha a sabedoria de não investir nela todas as suas energias e seu tempo.
  • Com a vivência, você conhecerá o seu limite real de ação. Direcione vontade e ação para o que, agora, pode e vale a pena ser mudado.
  • Frente ao que não pode ser alterado, mobilize essas duas forças: a aceitação, que é o consentimento da razão e a resignação, que é o consentimento do coração. De mãos dadas, elas levarão você ao aprendizado verdadeiro. Mas, atenção, essas potências só entram depois da saída da rebeldia inútil.

Só há uma coisa com a qual você não pode se resignar: com a própria resignação. Questione de vez em quando aquilo que você mesmo rotulou de imodificável e tente novamente, dessa vez com mais conhecimento de causa e equilíbrio interior. Quem sabe a hora do impossível não passou?

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Racismo

Meu filho, surpreendentemente ainda hoje, existe no mundo resquício de um pensamento muito antiquado, absurdo e vergonhoso que diz que algumas etnias (antigamente chamadas "raças") são naturalmente superiores (mais inteligentes, mais capazes e até mais honestas) a outras. Isso é o racismo, que, felizmente, já é considerado crime.


No século XV, com as viagens marítimas portuguesas e espanholas, os europeus tomaram contato com duas etnias até então praticamente desconhecidas: os índios e os negros. Adivinhe: eles ficaram felizes e resolveram entender e se inteirar de sua riqueza cultural ... ou ... tentaram dar uma roupagem às atrocidades que cometeram com eles criando teorias absurdas? Ah, essa foi fácil... Acertou: com os índios, para justificar a destruição cultural e a matança generalizada que promoveram em busca de riquezas nas Américas e com os negros para justificar o tráfico negreiro de escravos, disseram que eles não tinham alma! Problema resolvido: se não têm alma, não são seres humanos! Por isso usaram (e alguns de nós ainda repetimos, muito erradamente) o termo "descobrimento" para o Brasil: não havia "humanos" aqui, era "despovoado", logo foi "descoberto" e não invadido!

Foi no século XIX que voltaram ao tema, tentando dar a ele um ar científico. Diziam que as diferenças de cor da pele e da morfologia da face determinariam uma série de características (e limitações) dos indivíduos. Até meados do século XX havia estudos que dividiam o ser humano em 4 "raças": negra africana, negra australiana, amarela e branca. Depois do nazismo e de suas iniquidades contra os judeus alegando superioridade da "raça ariana", o conceito de raça ficou enfraquecido. O golpe de misericórdia foi dado pela Genética, que demonstrou que não existe fundamento científico (genético) algum em qualquer separação entre seres humanos e que há apenas uma raça: a humana. Todo o resto é etnia, um conceito mais social do que físico.

E então? Por que ainda hoje existem indivíduos - e até organizações - que insistem em permanecer cinco séculos atrasados no pensamento? Diante de tantas evidências científicas, já inquestionáveis, diante de tantas campanhas, diante de tanta informação, poderiam alegar ignorância? Certamente não. A única resposta possível: má fé: reeditando os absurdos do século XV para justificar a manutenção de privilégios, o roubo e a desumanidade com que são tratados muitos povos no planeta.

É seu dever ser intransigente com qualquer forma de racismo. Os seres humanos, filho, se diferenciam por suas atitudes, por seus valores, por seu esforço, por sua educação, por sua vontade e perseverança em fazer o bem. Se existe uma "cor" que deve contar é a que está dentro da cabeça e do coração e não na pele.

sábado, 7 de novembro de 2015

Modelos mentais

Filho, uma das coisas mais interessantes sobre o ser humano é sua capacidade de criar padrões e imagens. Na quase totalidade das vezes, usa esses padrões formados para raciocinar e até inferir resultados futuros, o que pode ser útil em alguns casos ou perigoso em outros.


Diz-se que quando os portugueses chegaram na invasão do Brasil, em 1500, os índios demoraram alguns dias para enxergarem as caravelas, que estavam ancoradas. Embora seus olhos vissem a imagem, seu cérebro rejeitava a informação porque não tinha comparação com nada que já havia registrado, ou seja, como a realidade extrapolava seus padrões, foi necessário tempo até que a mente aceitasse a novidade. Isso acontece porque desenvolvemos os chamados "modelos mentais".

É claro que isso é muito útil quando precisamos de uma resposta rápida, baseada na experiência, de entendimento ágil e ação imediata. Grande parte das necessidades cotidianas de um ser humano normal depende de um bom modelo mental. Mas há riscos sobre os quais eu preciso te alertar:
  • As pessoas têm modelos mentais (às vezes muito) distintos. Quando detectar uma diferença grande nas experiências ou nas formas de pensar, tenha certeza de que o que você disse foi entendido e que você entendeu o que os outros disseram.
  • A não ser que você esteja lidando com uma formalidade jurídica, importa mais o que as pessoas quiseram dizer do que o que elas disseram. Busque sempre as ideias, o significado por trás das palavras e você terá muito mais chance de sucesso na sua comunicação.
  • Fale sobre algum assunto para uma criança de 10 anos (com modelo mental muito menos contaminado) e peça para ela depois te dizer de volta o que você falou. Se for discrepante demais, sua chance de ser entendido por um público heterogêneo é pequena.
  • Tenha empatia. Procure entender o mundo pelos olhos do outro. Para isso, é preciso que você se dispa do seu modelo e tente pensar com a cabeça alheia. É um exercício, mas é viciante.
  • Os inovadores têm um traço comum: todos eles fogem do modelo mental na hora de inovar. Grandes ideias sempre têm um componente não óbvio em seu desenvolvimento. Ou seja: deixe as paredes do seu modelo mental retráteis e as retraia quando precisar da caixa aberta.
  • O progresso do pensamento depende de seu modelo mental estar aberto à evolução. Lembre-se de sempre questioná-lo. Comece pelo que você acha que é verdade absoluta. Coloque os seus dogmas em cheque o tempo todo, por mais que doa e dê a sensação de falta de chão.

Em suma, tenha coragem de olhar o mundo diferente sempre que for preciso ou por mero exercício. O passado pode guiar, mas do futuro não amarrado por ele também surgem ideias espetaculares.

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Buzina

Filho, para evitar acidentes, os carros possuem buzinas. Como normalmente ocorre quando uma ferramenta genérica fica disponível a pessoas incivilizadas, seu uso pode ser desastroso.


Especialmente em cidades grandes, o som da buzina, estridente, espalha-se com facilidade e gera incômodo a todos os que o escutam. Para entender isso em grau extremo, experimente dirigir no Peru ou na Índia e você vai entender por que, hoje, 70% da poluição sonora nesses países provêm das buzinas e como isso tem aumentado o número de pessoas com problemas de audição (e, talvez, de sanidade). Por isso, te peço:
  • Não use a buzina como primeiro alerta. Se puder, antes, pisque o farol ou sinalize com a mão;
  • Tenha em mente que o uso da buzina só se justifica se o benefício for maior que o incômodo;
  • Imagine que toda buzina acorda um bebê, perturba um idoso, agita uma pessoa com deficiência ou distrai alguém muito concentrado;
  • Esteja certo de que quem abusa hoje da buzina, amanhã poderá ser importunado por ela;
  • Seja criativo para locais que usam buzina como forma de alerta desnecessariamente (entradas de prédios, por exemplo, podem ter dispositivos mais inteligentes para chamar o porteiro como sensores, controles remotos, câmeras, espelhos bem colocados, etc.);
  • Se tiver que usar a buzina, aperte-a apenas pelo tempo estritamente necessário, evitando descontar nela raiva pelo episódio, pelo atraso ou pelo mundo.

Nas pequenas atitudes residem os grandes princípios aplicados. Faça, nelas também, pelo exemplo, seu cartão de visitas e sua ponte para uma consciência cívica mais completa. Todos têm a ganhar.

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Namoro: a aproximação

Meu filho, namorar é uma parte importante da vida. O relacionamento é uma arma poderosa, como tudo o que mexe com o nosso indomado emocional. Não é bom nem mau em princípio: são as suas atividades, as suas posturas, as suas intenções, a sua atenção que farão dele ou um ato prazeroso e benéfico ou torturante e destruidor. A escolha é sua.


Vou escrever algumas coisas sobre o namoro. Vou dividir para que não fiquem grandes para você. Hoje falaremos da aproximação.

É muito melhor começar certo do que tentar endireitar o que começou torto. O que isso significa? Que quanto mais recheada de espontaneidade for essa primeira abordagem, maior a chance de você conseguir selecionar, desde o início, alguém que combine com você e possa somar na sua vida.

Com base na minha experiência (segundo sua mãe, "vastíssima" ...), eu deixo a você os seguintes conselhos gerais sobre esse approach:
  • O ambiente seleciona as pessoas. A chance de encontrar alguém interessado em arte em um museu é muito maior do que em um bar.
  • Os amigos falam muito sobre os interesses e, às vezes, até sobre os valores das pessoas. Diz o ditado popular: "diga-me com quem andas e te direi quem és", que, em geral, é verdadeiro.
  • Leia coisas interessantes da atualidade e crie suas próprias conclusões. É importante saber um pouco sobre cada assunto, com algum toque pessoal, para engatar uma conversa.
  • "O tipo de isca determina o tipo de peixe", dizem os pescadores. A forma de você se apresentar (fisicamente, intelectualmente, emocionalmente, socialmente) é a referência que está escolhendo usar. Mostrar algo que você não é trará alguém que você não quer.
  • Observe e veja o que o seu segundo impulso vai dizer. O primeiro geralmente é mais visceral, o segundo um pouco (às vezes bem pouco) mais lúcido.
  • Faça-a falar (por meio de perguntas discretas) e interesse-se pelo que ela diz, mas não deixe claro que você está interessado nela. O início da dança precisa ter um componente de dúvida.
  • Por falar em dança, se puder aprenda a dançar alguma coisa. Além de ser divertido, permite uma cumplicidade física que pode se desdobrar para uma outra emocional.
  • Use o humor e a provocação intelectual, mas com moderação. O exagero o rotulará como bobo.
  • Quando encontrar um assunto em comum que faça brilhar os olhos, o prolongue um pouco mais. Será um teste para saber se o interesse comum é genuíno.
  • A linguagem mais importante é a não verbal. Aprenda a ler os sinais sutis do desejo. A falha em lê-los ou a interpretação errada deles pode fazer com que perca oportunidades e, por outro lado, tenha decepções. O corpo fala muito mais do que a boca. Aguce seus sentidos.
  • A surpresa criativa pode ser uma arma mortal. Use, mas não abuse.
  • Nunca se aproveite da fragilidade alheia. Nunca. Ponto.
  • Seja respeitoso. A dança precisa ser gradual. Saiba reconhecer o "não" e se retirar com dignidade, se for o caso, sem mágoas. As pessoas têm o direito de escolher com quem querem conversar, sair, namorar. Em hipótese alguma seja agressivo, nem fisicamente, nem intelectualmente, nem emocionalmente. Em hipótese alguma.

Por fim, nada disso é absoluto - a experiência precisa ser sua. Lance-se na aventura do flerte sadio, da paquera alegre, e você terá muitas histórias boas - ou, pelo menos engraçadas - para contar aos meus netos.