À guisa de introdução


Este é um espaço de coleção de pensamentos para meu filho Antonio.

Categorizei as postagens por fase da vida em que imagino que serão úteis a ele, divididas em períodos de 7 anos. Assim, onde estiver marcado "1setenio" são para de 0 a 7 anos, "2setenio" para 7 a 14, e assim por diante.


quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Tahr

Filho, ontem uma chocante imagem do corpo de uma criança numa praia da Turquia rodou o mundo. Ela estava junto com outras 11 pessoas em um barco de refugiados fugindo de um grupo islâmico radical rumo à Grécia. Peço licença a você, meu amor, mas hoje eu vou escrever para essa criança, que vou chamar de طاهر (lê-se "Tahr") que, em árabe, significa "inocente, puro".


"Querido Tahr, ontem a parte do mundo que conseguiu dormir não tirou da mente a sua foto deitado na praia. Tivemos que olhar várias vezes porque você, com sua roupinha colorida, seu sapatinho certinho, sua posição de dormir, parecia muito com nossos filhos.

Ao contrário das imagens de guerra, numa praia calma, no silêncio da Natureza, sereno, lá estava você, depois de todo esforço para fugir do radicalismo louco, com o corpinho intacto, simbolicamente de costas para a humanidade.

'Vira, Tahr! Acorda! Levanta! Está tudo bem!', deve ter gritado aquele soldado turco que foi enviado para te pegar na praia. O mundo todo pediu isso para a foto. Mas você não se mexeu.

Ninguém entendeu nada ainda, não é, rapazinho? Como é difícil explicar as coisas para os adultos, não é? Somos nós que estamos de costas, não você! Não foi você quem não nos olhou, fomos nós que não olhamos para você! Somos nós que estamos caídos, não você! Os choros que você ouviu, pequenininho, não são por você - são por nós!

Você lutou e venceu como um valente guerreiro uma batalha muito maior do que a sua própria vida: você se sacrificou como espelho para nossas misérias, nossa frieza, nossa hipocrisia, nossa indiferença, nosso egoísmo. Nossa desumanidade. Tahr, você é nosso herói!

Tivemos que olhar várias vezes porque você parecia muito com nossos filhos. Mais tarde, criança, é que tivemos a confirmação: você, na verdade, É cada um de nossos bebês. Você é o símbolo do futuro que estamos construindo.

Tahr, nosso bebê, muito obrigado! Você fez diferença. Vá em paz."

Um comentário:

  1. Um belo texto. Mas preferia que não tivesse existido. Preferia que Tahr e todos os outros, não precisassem de fugir. E se precisassem, que não tivessem que morrer tentando serem livres.

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