À guisa de introdução


Este é um espaço de coleção de pensamentos para meu filho Antonio.

Categorizei as postagens por fase da vida em que imagino que serão úteis a ele, divididas em períodos de 7 anos. Assim, onde estiver marcado "1setenio" são para de 0 a 7 anos, "2setenio" para 7 a 14, e assim por diante.


terça-feira, 28 de novembro de 2017

Coerência

Filho, em Física uma onda é dita coerente quando é possível prever o comportamento do campo de um de seus pontos com base em outro, ou, de outra forma dizendo, seus componentes (como os fótons, no caso da luz) estão "em fase". O laser é uma radiação coerente - e aí reside seu poder.


Imagine alguém que fale coisas variantes, imprevisíveis, até contraditórias; alguém cujas ideias dançam ao sabor das situações ou do humor. Diz-se, acertadamente, que essa pessoa é incoerente. E, assim como na Física ondas "fora de fase" tornam o feixe fraco ou nulo, também a ação, no campo do comportamento, precisa de coerência para sustentar confiabilidade e efetividade.

Cuidado: isso nada tem a ver com cristalizar seus pontos de vista e, com isso, não evoluir no pensamento. Não. Mas te sugiro que sempre que for "mudar a fase" da "onda" de suas opiniões, faça-o com consciência. Como? Usando dois caminhos paralelos: consistência e conexão.
  • Consistência: é a busca de lastro de lógica e bom senso que "dá forma" à onda de suas ideias, mesmo que elas sejam equivocadas. É a medida de honestidade intelectual do que você concebe e/ou acredita. Procure não formar para si conceitos disformes que não se sustentam frente a 2 minutos de realidade objetiva. Eles só te isolarão do mundo sem proveito algum.
  • Conexão: é o caminho percorrido do progresso da ideia. O que o levou a mudar de opinião? Se dois conceitos - um antigo e um novo - são consistentes, você poderá conectá-los, tornando-se consciente e capaz de explicar o salto, os motivos que o levaram a alterar aquela concepção.

Para você, meu filho, a coerência, é, portanto, escada firme de evolução e da expressão genuína e saudável de si próprio. Para os outros, é um traço que você deve observar como medida do grau de confiança que você pode ter neles. Assim, para si e para os demais: busque-a, observe-a, questione-a. É seu termômetro. Não se esqueça disso.

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

"Show me"

Filho, os que trabalhamos com auditoria costumamos usar essa expressão inglesa "show me" para pedir evidências objetivas daquilo que observamos, das informações que recebemos. O povo latino é muito melindrado com esse pedido e sempre leva ao pessoal, achando que é uma desconfiança de sua honestidade. Não é. Procurar, às vezes pedir e sempre analisar fatos além de palavras é uma prática muito recomendada.


Algumas pessoas têm uma séria tendência ao descolamento da realidade. Elas criam, por mecanismos internos, palcos imaginários nos quais passam a atuar e paulatinamente seus pensamentos e ações começam a se distanciar dos fatos concretos. Cuidado para não se deixar levar por sua visão esquizofrênica! O melhor remédio para isso é o "show me" - mesmo que não explicitamente. Volte à Terra, ponha os pés no chão, desapaixonadamente vasculhe os dados, evitando tirar conclusões, e monte para si um painel duro, frio, do mundo real.

Mesmo que não esteja lidando com uma mente alienada, o "show me" será seu aliado para fugir do lugar comum, do senso comum. Faça a conta e - como diria um amigo do papai - "perca para a conta". Algumas coisas são ilógicas mas dão segurança psicológica. Não há nada de errado com isso, desde que você saiba o que está fazendo. Quem consegue fugir do óbvio e se treina a fazer a conta o tempo todo descobre alguns tesouros escondidos importantes.

Por fim, meu filho, o pensamento objetivo fundamentado na realidade será seu escudo contra sua própria alienação, como meio de reflexão. O que você está fazendo é razoável? É justo? Tem coerência? Sua opinião sobre algo tem que lastro?

Estude, se baseie e esteja de sua parte sempre pronto para apresentar as evidências de seus pensamentos, de suas conclusões. Vivendo num mundo onde a imaginação divide espaço com a realidade, os fatos objetivos serão sempre seus fieis escudeiros.

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Violência

Meu filho, foram muito poucos os anos de paz na História. A selvageria, direta ou indireta, até hoje dita as relações entre os povos. Com os indivíduos não é diferente. Mas de onde ela vem? O que gera? Qual é o seu preço?

Quadro "A face da guerra", de Salvador Dalí (1940)

A violência é filha direta da ignorância. O hostil é, via de regra, um gregário, um atrasado. A truculência é o recurso do incompetente: de quem não consegue dialogar, de quem não tem argumentos, de quem não tem respeito à condição humana - nem à sua própria. É uma arma que apodrece a mão de quem a usa. Você pode até sentir, na hora, raiva de quem seja violento com você ou com quem você ama, mas você perceberá que o sentimento mais adequado é a pena.

Não significa dizer que você deva se deixar ser violentado. Corte a agressividade, mas sem se deixar envolver por ela. Seja frio, direto. Não tenha medo de se afastar de quem insiste em seu uso. Ele encontrará nos iguais a ele a lição de que precisa, sem que você precise gastar energia com isso.

A consequência da violência é a perda de naturalidade. E aí está o grande paradoxo que decepciona os furiosos: suas conquistas são como areia a escorrer entre os dedos, porque quando conseguem dominar, a pessoa dominada não é mais a pessoa desejada. Como a tartaruga, ela se retrai e deixa à mostra apenas o casco, afastando sua alma para o mundo interior onde passa a buscar, novamente, a liberdade e a paz. E quando a conquista, deixa o brutal para trás, apagando-o até da memória.

Não seja passivo, mas não tenha vergonha de ser pacífico. A violência se alimenta da própria violência e não suporta a serenidade. A construção de um mundo de paz passa pela construção de um coração em paz.