À guisa de introdução


Este é um espaço de coleção de pensamentos para meu filho Antonio.

Categorizei as postagens por fase da vida em que imagino que serão úteis a ele, divididas em períodos de 7 anos. Assim, onde estiver marcado "1setenio" são para de 0 a 7 anos, "2setenio" para 7 a 14, e assim por diante.


quarta-feira, 24 de outubro de 2018

"Ela não está dodói"

Meu filho, hoje minha madrinha e sua fã incondicional, partiu deste mundo sem dar tchau. Você estava comigo quando soube e tentei explicá-lo: "Filho, papai vão ter que deixá-lo com a mamãe porque a Tia Balila está dodói e papai precisa ir lá cuidar dela".

Você, com a maior naturalidade do mundo, me olhou nos olhos com sua sabedoria infantil e me respondeu: "Não, papai. A Tia Balila não está dodói. Ela está bem". E me deixou ir.


Nesta foto, de tão poucos dias atrás, você, vendo que a Tia Balila caminhava com dificuldade, sozinho voltou, deu a mão para ela e disse: "Tia Balila, deixa eu te ajudar.". Sem saber, hoje você também fez isso por seu pai.

Cultive sempre em seu coração, meu amor, essa simplicidade e essa sensibilidade assim aliadas. Você, com essas armas, ajudará a mudar a face do mundo.

-- Vá em paz, minha madrinha, tantas vezes minha mãe. Muito obrigado por tudo. Você fez toda a diferença.

segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Onde falta ... sobra ...

Meu filho, não se engane:

Onde falta informação, sobra achismo.
Onde falta razão, sobra piti.
Onde falta educação, sobra grosseria.
Onde falta instrução, sobra certeza.
Onde falta respeito, sobra truculência.
Onde falta audição, sobra discurso.
Onde falta visão, sobra ilusão.
Onde falta humanidade, sobra segregação.
Onde falta esperança, sobra pessimismo.
Onde falta humildade, sobra cegueira.
Onde falta equilíbrio, sobra nervosismo.
Onde falta humanidade, sobra preconceito.
Onde falta empatia, sobra frieza.
Onde falta ação, sobra sistema.
Onde falta ideia, sobra burocracia.
Onde falta amor, sobra dureza.


Onde falta o bem, sobra o mal.

Não deixe em seu cérebro nem em seu coração espaços vazios.
Eles serão ocupados por invasores indesejáveis, dos quais você terá dificuldade de se livrar.

domingo, 8 de julho de 2018

Foros

Filho, ficará claro para você, com o decorrer da vida, que as pessoas estão em variados níveis intelectuais, morais, sentimentais, sociais, etc. Se deixadas por si, elas buscarão seus semelhantes. Assim, se reúnem espontaneamente, de lados opostos que não se falariam: os benfeitores e os criminosos; os intelectuais e os toscos; os honestos e os ladrões. Mas há locais em que essas diferenças se encontram: são os visnetos latinos, ou os foros.


Por um lado, a quebra dos grupos naturais promove a diversidade e só por ela se oxigena o pensamento. Não estar apenas com quem te dá prazer é uma forma de autoeducação importante na sua formação. Ouvir, observar, treinar-se para ver com os olhos do diferente aumenta sua flexibilidade de entendimento e exercita sua humildade. Sempre que puder, valorize essas oportunidades de convivência com o diferente.

Por outro, quando você é obrigado a conviver, diuturnamente, com outros cujos princípios diferem radicalmente dos seus, é possível que se sinta desgastado, chateado, contrariado.

Os foros são esses locais de encontro na vida, casuais ou continuados. Os mais comuns são a família e as empresas. Imagine ter um filho muito superior a você, cognitiva ou eticamente: você, pai, no exercício do pátrio poder, pode ter uma posição de entendimento e aprendizado - sem fugir à sua responsabilidade - ou de reatividade e irritação. A primeira te faz tornar útil a experiência, a segunda, sofrer. O mesmo raciocínio em relação a alguém com posição hierárquica no mundo corporativo acima ou abaixo de você.

Reconhecer e compreender os foros, meu filho, te fará extrair das situações, mesmo das opressivas - onde você é obrigado a conviver com um entendimento flagrantemente inferior ao seu - as lições necessárias de paciência, entendimento e elevação.

Seja você mesmo, enxergue-se em si. Não perca sua essência de vista. Conviva com consciência, mas não se deixe nivelar por baixo. Busque suas origens, seus grupos de afinidade natural como combustível para os foros difíceis, mas não fuja deles. Os encontros que ali se dão só se dão ali.

domingo, 10 de junho de 2018

Aranha

Filho, hoje caminhava e vi uma aranha em sua teia. A maior parte das pessoas não se deu conta do espetáculo que estava à sua frente. Mas eu me detive para poder escrever a você.

  • A construção da teia começa com um primeiro ponto de apoio. Ele é essencial para a integridade da teia. Nas suas empreitadas, antes gaste tempo identificando seu ponto firme.
  • O material da teia é uma seda mais resistente do que o kevlar, usado em coletes à prova de balas. Não economize na qualidade da materialização do que você concebeu pelo pensamento, nem sob pretexto de urgência.
  • Caminhe reto, como a aranha, em direção ao meio de onde será sua teia, tecendo de forma firme o caminho atrás de você.
  • Então, a primeira estrutura da teia é o círculo central. Ele é a ideia principal em um empreendimento na vida. Esteja ciente de que a estabilidade depende dessa peça central. Ela é o propósito, o significado, o símbolo de sua construção.
  • A construção da teia é de dentro para fora. Desdobre o pensamento principal em outros secundários, concêntricos, e interconecte-os de forma harmônica.
  • Há dois tipos de fio na teia: um que gruda (para prender os insetos) e outro seco (para andar). Assim também é com suas iniciativas: parte delas faz sentido deixar viradas para o exterior (comunicação), mas outra parte precisa ser de caminhos só seus.
  • No local mais seguro da teia ela deposita seus ovos e os protege com o próprio material ultrarresistente dela. Faça o mesmo com os filhos das suas ideias, e com os seus também. 
  • Caso ela se perca, sabe usar a linha mestra que originou a teia para sair dela. Não perca suas linhas mestras, suas referências, por mais encantadores que sejam seus projetos. Elas te levarão de volta aos seus pontos firmes, caso você necessite.

Por fim, meu filho, veja que a aranha vive na teia que construiu e dela faz seu lar. Ela faz seu próprio caminho e depois caminha nele, depositando a confiança de sua própria vida como garantia de seu trabalho. Caminhe assim também você pelas estradas que pavimentar: com prudência, mas sem medo. Suas teias serão seu legado.

Lave a sua louça!

Meu filho, você já parou alguns instantes em frente a uma pia cheia de louça suja? Faça isso. O que essa cena te diz? O que ela quer te ensinar?


Ela é o símbolo de nossas ações - passadas, presentes e futuras. A louça usada é o que temos que ajeitar, a água do que estamos fazendo para isso e nosso desejo de limpeza o objetivo. Por isso, denotativa e conotativamente, entenda os pensamentos simples que compartilho contigo:
  • Você pode ter aulas de como lavar louça com os melhores professores, você pode estudar casos de sucesso, aprender técnicas. Podem te ajudar a se preparar, mas sua louça é sempre sua;
  • Máquina de lavar louça só existe no mundo material - e mesmo assim, você precisa preparar o conteúdo para limpeza antes de usá-la;
  • Justificar por que a pia está suja ou culpar outros não ajuda na limpeza;
  • O segredo de uma pia limpa é, dia-a-dia, lavar mais itens do que sujar;
  • Você não precisa necessariamente lavar o prato usado hoje - às vezes é melhor deixá-lo de molho para soltar a gordura primeiro;
  • Se descobrir na sua casa uma pia que você não conhecia lotada, não se desespere - você tem tempo. Importa mais seu saldo diário e seu compromisso com a limpeza do que a velocidade;
  • Alguns pratos precisam de produtos especiais para tirar a sujeira. Se você não os tiver, terá que pedi-los a outros. Lave o melhor que puder, faça sua parte. Deixe na louça a marca de seu comprometimento. O removedor chegará no futuro para você finalizar o serviço;
  • Quando a morte chegar, é bom estar com a pia limpa - a limpeza depois é mais difícil.

Cuide da pia da sua casa exterior por questão de higiene, mas principalmente da sua casa interior, por questão de sanidade. Uma agenda positiva no campo das ações fará você viver feliz consigo mesmo e dormir bem com o cheirinho de limpeza na pia da sua consciência.

sábado, 26 de maio de 2018

Bom x "bonzinho"

Filho, a vida de alguém que busca ser honesto não é fácil. Você não disporá das mesmas armas que os patifes, porque as considerará moralmente ilegítimas. Não caia na tentação de usá-las, mesmo que ache a guerra desigual - elas ferirão mais você e sua consciência do que seus adversários. Trilhar o caminho da ética exige convicção firme de que as alegrias que a alma leve proporciona não estão ao alcance dos canalhas.

Mas não significa que você seja obrigado a tolerar tudo, atender tudo, ouvir tudo, fazer tudo. Nem deve. Parte considerável de sua força virá de sua higiene (mental, emocional, social, etc.). Faça-a sem hesitar um segundo, sem se culpar um milímetro.


Alguns drenos de sua vitalidade virão de fora, outros de dentro. Mas a solução para eles está sempre em você: na sua firmeza, na sua retidão, na sua assertividade, consigo mesmo e com os outros.
  • Gerencie seu tempo. Limite-o para os "sugadores de tempo". Corte se necessário.
  • Tenha tempo para você, sozinho. Estabeleça-o e não abra mão dele. Não admita interferência em seu uso. Faça o que quiser, o que gostar, o que te dá prazer, desde que seja para você.
  • Diga "não" imediatamente ao que fere os seus princípios, de forma educada, mas inequívoca. Não deixe que algo que vilipendia seus valores siga em frente contigo por mera educação.
  • Afaste-se de contatos contínuos com pessoas tóxicas: mentirosas, fofoqueiras, más, ou simplesmente negativas, invejosas, que gostam de se vitimar. Você pode ajudá-las, por um período determinado, mas sem a elas expor sua intimidade. Mantenha seu círculo de amizade limpo com interesses comuns, positivismo, alegria, bem-querer genuíno, verdade: é uma poderosa trincheira de proteção energética.
  • Não tome para si algo "ficar chato" se você está fazendo o certo. Quem tem que ser punido é quem está errado, não você. Normalmente essas pessoas são sem noção do razoável, mas isso não é desculpa para que você ceda. Use os meios necessários para pará-las, mas não assuma para você uma carga que não é sua.
  • Responda no mesmo fórum e de preferência na hora a qualquer tentativa de imputar a você algum constrangimento em público. A omissão, nesse caso, não é educação, é assumir peso alheio que ficará ressonando em sua mente. Quem escolheu as condições foi o outro, ele que arque com as consequências de sua escolha. Seja cirúrgico, mas definitivo, na sua resposta.

Me preocupo muito contigo, meu filho amado, porque tento te ensinar a ser um bom ser humano, mas os bons seres humanos, num mundo com muito mal espalhado, precisam ser muito cuidadosos consigo mesmos, porque há uma diferença entre ser bom e ser "bonzinho": o "bonzinho" não educa, morre mais cedo, absorve e é infeliz, e, com isso, deixa de ser bom o quanto poderia.

quinta-feira, 17 de maio de 2018

A calça no cabide

Filho, hoje eu fui pendurar minha calça num cabide e lembrei de você quando me dei conta de que ali, naquele simples gesto, estava um ensinamento precioso para a vida.


Você já tentou pendurar uma calça bem lisa em um cabide com a cintura alinhada com o fim da perna? O que acontece com ela? Desliza até cair. Por quê? Porque a cintura é a parte mais pesada da calça e o centro de gravidade dela não está no seu meio, mas mais próximo à parte mais densa - está, portanto, deslocado para cima.

A calça no cabide, meu filho, te grita aos olhos: igualdade não é sinônimo de equilíbrio.

Saiba identificar na vida os lados mais pesados e mais leves, mais e menos densos, mais e menos compactos, e encare-os com a sabedoria do cabide: o ponto de balanço provavelmente não está no meio entre eles - o lado mais fraco precisará de mais "tecido" para que dessa "igualdade desigual" nasça a justiça.

segunda-feira, 14 de maio de 2018

Arcanjos

Meu filho, todas as tradições filosófico-religiosas, de formas distintas, reportam a existência de seres superiores aos homens que têm a função de guiar os passos espirituais da humanidade. Não importa se você pessoalmente acredita na sua existência objetiva ou não - quero lhe falar sobre o significado de um dos representantes dessas hierarquias: os arcanjos - e como ele pode ajudar na sua interação com os outros.

"To Touch a Star" por Jeshu ben Pandira

Se os anjos são apresentados como os protetores individuais, os arcanjos são os orientadores dos conglomerados, das comunidades, dos povos. Quando um grupo se forma em torno de um ponto comum, mesmo que constituído de apenas duas pessoas, inaugura um novo ser coletivo, gestado a partir da união de ideias, sentimentos e ações de seus membros. Diz-se, arquetipicamente, que ele passa a possuir um 'arcanjo'. É uma outra forma de falar que tudo se passará como se ele fosse maior o que a soma de seus constituintes, construísse uma identidade e uma razão de ser, e caminhasse muitas vezes apesar das divergências dos "anjos" de cada um.

E, ainda no campo metafórico, se quiser:
  • Tenha atenção às ideias maiores do que pessoas, por mais absurdas que lhe pareçam. Se nascem de um entendimento real entre seres humanos, mesmo para o mal, têm um "arcanjo". Respeite o "arcanjo".
  • Quando for interagir com um grupo, numa consultoria, num atendimento, vá acompanhado de pessoas que formem contigo um corpo com objetivos comuns. Não coloque seu "anjo" de cara com um "arcanjo". Que converse "arcanjo" com "arcanjo".
  • Procure desvelar esse ser coletivo acima dos "anjos" individuais. Qual o traço comum que está ali posto? Qual o objetivo maior? Outra vez: seu "anjo" tem menos chance de fazer você ver isso do que o "arcanjo" que represente sua ideia. "Arcanjo" enxerga melhor "arcanjo".
  • Às vezes os "anjos" não veem os "arcanjos". Se você estiver em sintonia com o "arcanjo" de sua equipe, vendo o "arcanjo" da outra, ajude os "anjos" a enxergá-lo também.

O arcanjo é um ícone poderoso que nos lembra diuturnamente a força da união de vontades por um mesmo foco. Trabalhe com ele, porque ele nasceu para ser o mensageiro das estrelas para a terra, da consciência coletiva para a realização conjunta, da humanidade para a divindade humana.

quarta-feira, 11 de abril de 2018

Quando ... em frente a um anúncio fúnebre

Filho, quando você estiver em um elevador, corredor, mural, e seus olhos avistarem algum anúncio fúnebre, de morte ou serviço religioso, de alguém que você conheça ou não, pare por 5 segundos.


Revire sua alma em busca de um momento feliz seu e dedique essa memória a essa pessoa. Independente de sua crença pessoal sobre a eficácia dessa doação para o falecido, esse ato te fará um coração mais sensível, mais atento, mais reverente à vida.

sábado, 17 de março de 2018

Condução óssea

Meu filho, você já ouviu sua voz gravada? Ela parece bem diferente da que você conhece, não é mesmo? Sabe por quê? Porque parte do que ouvimos de nós mesmos chega aos ouvidos não pelo ar, mas pelo crânio. Isso é chamado de "condução óssea". Beethoven descobriu isso e, mesmo surdo, continuou conseguindo 'ouvir' sua música encostando uma vareta no piano e na própria cabeça. Vários aparelhos auditivos hoje se beneficiam desse fenômeno. Mas por que falo a você dele?


Porque é importante tomar cuidado com o que você fala. A palavra é uma poderosa arma que faz superar obstáculos ou criar enormes abismos entre as pessoas. Felizmente o bom uso da 'transmissão óssea' pode ser muito útil a você.

  • Lembre que quem te ouve não ouve o que você ouve. Confira se a parte da voz que ele recebeu foi suficiente para que entendesse a sua mensagem;
  • Lembre-se que o que você ouve é apenas parte do que o outro disse. Pergunte para preencher as lacunas - não finja entender se ainda tem dúvidas;
  • Ouça-se. A mensagem que você quer transmitir foi fielmente representada pelo conteúdo da sua fala? E pela forma?

Avançando um pouco mais, você perceberá que não é só o crânio que 'esconde' um abismo entre o que falamos para nós mesmos e o que dizemos aos outros. Nossos sentimentos, nossas idiossincrasias, nossos preconceitos, nossa história, também são poderosos componentes de nossas ideias que às vezes não exteriorizamos - e que tornam nossa expressão às vezes incompleta ou mesmo confusa. Se a voz pelo ar não é suficiente para exprimir sua intenção, use outros meios: mímicas, sorrisos, abraços, toques, sendo você 'o mais todo' que puder.

Toda vez que parar para ouvir sua própria voz, pergunte-se: o 'Eu' que você é e que 'fala' de muitas maneiras é visto por você diferente de pelos outros? Você pode ser mais você, ter mais presença? Para pessoas especiais, permita-se ser o piano de Beethoven e abra-se para ser sondado além das palavras.